quinta-feira, 25 de agosto de 2016

XIKO MENDES

PRÓLOGO PARA O MEU LIVRO DA VIDA
Autor: XIKO MENDES
(Homenagem para minha sobrinha LORRANE S. MENDES como Mensagem de Agradecimento por sua Formatura na Universidade de Brasília em agosto de 2016).

Somos a história que construímos ao longo da trajetória de nossa curta existência terrena. O Livro da Vida não é como um caderno de escola onde usamos corretivo ou passamos a borracha em tudo que escrevemos. No Livro da Vida, a releitura de cada página muitas vezes nos faz chorar, outras vezes nos fazem rir sozinhos, mas em qualquer das duas situações, é a caneta (livre-arbítrio) que utilizamos na escrita da existência que define o que os outros falarão sobre nós, hoje ou quando morrermos, e deixarmos aqui inscritos nas pedras (lápides) do mundo nossos erros e acertos. Independente do que a Posteridade vir a julgar sobre erros e acertos, uma coisa é certa: a Vida é sempre um livro inacabado, cheio de rabiscos, correções pela metade, anotações (margem de erro) em mosaico-labirinto, mas a vida nunca se reescreve em tintas diferentes daquelas que escolhemos para pintar nossa felicidade ou tristeza.
O Livro da Vida é um manuscrito-palimpsesto, inalterável e imponderável, sobre o qual nunca se escreve nada que não seja consequência dos atos (certos ou errados) tomados durante nossa existência. Podemos até tentar rasgar muitas páginas do livro de nossa vida, mas elas persistirão, inquietas e movediças, trilhando, como fantasmas sonâmbulos, noites de insônia (por arrependimento decidido tarde demais) ou dias de tédio (por termos tomado decisões erradas ou irreversíveis).
No Livro da Vida não há heróis ou bandidos, absolvidos ou condenados. Há sempre alguém que reinventa o pecado para o eterno ritual de expiação de seus erros. Há sempre alguém agindo como Cérbero fechando janelas e impedindo portas de se abrirem para contemplarmos a beleza do mundo, o mistério da vida, nas bordas fronteiriças do Universo. Mas, sempre e sempre mesmo, na última página do Livro da Vida, como epílogo ou epitáfio, haverá sempre um espaço em branco para usarmos a caneta de nossa existência e deixar nele nossas últimas palavras como honras fúnebres: PERDÃO, REDENÇÃO, RECOMEÇO, AMOR, RESIGNAÇÃO...

O Livro da Vida não é purgatório nem limbo, não é manual de escatologia do juízo final com palavras ditadas por  profetas inconsequentes, mas nele há prólogo e epílogo sem determinismo teleológico porque a Vida quer de nós mais que coragem, mais que arrependimento, mais que desculpas para um fim com absolvição no leito de morte. A Vida quer de cada um é atitude autocrítica e humanística para consigo mesmo e para com os outros, ATITUDE COM HUMILDADE para mudar o que não é possível de se reescrever no Livro da Vida. 

sábado, 13 de agosto de 2016

ESTEVA RODRIGUES DE SOUZA, 1929-2010.

Morte de Mãe

“Eu Sou a Ressurreição e a Vida. Quem exercer Fé sobre Mim, ainda que morra, viverá” (Jesus dialogando com Marta sobre Lázaro, In: 2 João, 11: 25).
Homenagem à minha mãe, que faleceu dia 6 de julho de 2010.
Xiko Mendes
Todas as dores passam.
As dores do parto enquanto o filho nasce;
As dores de cabeça quando os problemas se resolvem;
As dores de cotovelo quando a paixão acaba.
Mas há uma dor que é lancinante e definitiva:
A dor de perder uma Mãe.
Qualquer que seja a mãe: branca, negra, rica, pobre,
Boa, ruim...
Essa é a pior das dores do Mundo:
A dor que não dói num lugar específico do corpo.
Essa dor se espalha pelos poros, pela alma...
É uma dor que devora o pensamento,
Toma de conta do sentimento,
Invade o âmago da alma do mais impassível dos viventes.
É uma dor que exala uma saudade que nunca acaba;
É uma dor que aprisiona lembranças em cada detalhe vivido
Como um filme sem começo nem fim,
Como a foto que congela cenários em porta-retratos para sempre.
É uma dor que fixa residência em nosso espírito agonizante
Como a mais fulminante das obsessões humanas.
Qualquer Ser que pensa faz seu Ritual Iniciático
Para entrar no Mundo Humano
Incorporando ao seu vocabulário
A palavra MÃE logo no início da infância.
E durante a vida inteira
A gente se acostuma tanto
A chamar Mãe aqui, Mãe ali, Mãe acolá...
Que não nos damos conta de que um dia
Nos veremos paralisados diante da única Verdade
Imponderável do Universo: a Morte!
A morte de uma Mãe!!!
Ela nos cala!
Ela não apenas nos paralisa:
Ela neutraliza a pronúncia habitual “Mãe!”
Por outra mais aguda e numa agonia inquietante:
Mãããããeeeeee............................!!!!!!!!!!!!!!!!!
Acoooorda, MÃEEEEEE.........
Fala comigo, Mãeeeee...................
MÃE!!! MÃE!!! MÃE!!! (A Morte a levou!).
Depois disso, veem-nos um SILÊNCIO de doer fundo na Alma!
Gritamos para o Universo inteiro escutar,
Mas aí constatamos que Mãe não é um ser habitual;
É um Ser ÚNICO, eternamente INESQUECÍVEL!
Profundamente sagrado!
Mãe é um Ser mais que sublime:
É uma Dádiva Celestial!
E é por isso que a pior das dores
É a dor de perdê-la em sua dimensão física, PRESENCIAL,
Essencialmente humana.
Por mais que se creia numa outra dimensão de sua Existência,
Perder uma Mãe é perder metade de nós definitivamente.
Mas a Mãe que morre
É a mesma que RENASCE, sempre e eternamente,
Como a mais dolorosa das SAUDADES:
Aquela que nos acompanha em toda a nossa Vida.
Chorando...
Sorrindo...
Com olhos fixos no horizonte
Ou de cabeça baixa e em silêncio.
Morte de Mãe é dor que se multiplica
Com o passar dos anos.
Impiedosamente! Silenciosamente!
E só o Tempo, e apenas o tempo,
Nos devolve à Realidade:
A de que MÃE NÃO SE MORRE;
Mãe se VIVE em tudo que
Fazemos,
Sentimos,
Pensamos,
CONSTRUÍMOS...
E o que nos resta é consolarmos com o Apóstolo Paulo:
Agora, porém, permanecem a Fé, a Esperança e o Amor, estes três;
Mas o maior destes é o AMOR”.


MENDES, Xiko. Sonhos, Silêncio e Saudade em minha viagem ao fundo do Lago Formoso. Bsb: Unifam, 2012.

ESTEVA RODRIGUES DE SOUZA (1929-2010)

Memórias Póstumas de Dona Esteva
com Seu João em Seis de Julho de 2010, após 3:30

Xiko Mendes


O ano era 1929 e o dia, cinco de setembro,
Quando nasceu no vale do rio Carinhanha.
Em 1934 enquanto ainda estava crescendo
O pai dela morreu e isso a deixou tristonha.

Dona Esteva tinha pouco mais de dezessete
Quando sua querida mãe veio a falecimento.
Esse fato ocorreu naquele triste ano de 47,
Data de que falava com muito sentimento.

Era dois de agosto do inesquecível ano de 50
Quando ela realizou talvez seu maior sonho:
Ela tornou-se esposa até quase aos sessenta...
Anos de um longo bem-sucedido matrimônio.

Encontrou uma pessoa pra amar de coração.
Com ela constituiu família tendo dez filhos.
Ele foi o único amor de sua vida: Seu João,
O homem a quem ela sempre deu auxílio.

A família rendou uma prole de dez irmãos
Tendo como primogênito o Seu Valdivino;
Mais duas Marias, Horácio e os outros são:
Mário, Valtim, Zé, Xiko, Cloves e Arcelino.

Mulher guerreira e com a fé de quem sonha
Dar aos filhos um futuro com bom resultado,
Ela e o marido deixaram o vale do Carinhanha:
Vieram trabalhar e morar na fazenda Rasgado.

Como vaqueiros chegaram lá em junho de 60.
Ficaram até 68, na semana santa, mês de abril,
Quando retornaram de Formoso e dessa fazenda
Pra viver mais dois anos na beira do velho rio.

Em 1970, bem em meados do mês de agosto,
D. Esteva e seu João deixaram o Carinhanha.
Agora vieram definitivamente para Formoso
Pra, juntos, realizarem mais uma outra façanha.

Deixaram aquele rio e o lugar onde moravam.
Vieram pra estudar os filhos em solo mineiro.
Mas nunca esqueceriam a fazenda Canabrava,
Mesmo agora morando na chácara do Barreiro.

Formoso é a cidade que deixou a sua marca
Nessa que é a ilustre família Mendes de Souza.
Por uma década eles viveram naquela chácara.
Foi onde foram felizes e deixou lembrança boa.

Mas em 80, fim de ano, em 23 de novembro,
A família deixou de viver em ambiente rural.
Decidiu morar na cidade e eu bem me lembro:
Foi morar dentro de Formoso na rua principal.

Lá montou comércio e começou nova luta.
Comércio não deu certo, iniciou a dispersão.
E com a família toda agora já quase adulta,
Filhos foram mudando, só ficando a solidão.

Na cidade de Formoso se somou dezesseis
A quantidade de anos na rua Castelo Branco;
Foi quando, em março, dia 26 do ano de 96,
Dona Esteva e Seu João tiveram novos planos.

Mudaram de Formoso: se fixaram em Brasília.
Lá viveram unidos por mais uns quatorze anos.
Mas, em seis de julho de 2010, foi essa família
Obrigada a alterar sua vida em outros planos.

Dona Esteva faleceu deixando uma bela história.
E o Seu João, o Patriarca, mantém todos unidos.
Dona Esteva foi pro céu, mas aqui sua memória,
É uma lição com exemplos que serão seguidos.

Enquanto isso, o Seu João, que nasceu em 28,
Mantém-se na família como o grande patriarca.
Ele é nosso herói, homem simples, mas afoito,
Por criar 10 filhos deixando na terra sua marca.

O Seu João também é um grande personagem!
Nasceu na fazenda Muriçoca, na mesma região
De Dona Esteva que, com ele, teve coragem
Para, juntos, realizarem essa transformação.

Quando o Seu João veio viver nesse mundo,
Deus mandou pra ele a sua grande parceira.
Desde que ele nasceu em dezenove de junho,
Ela o acompanhou sempre: ela é Dona Esteva!

Seu João foi habilidoso amansador de cavalos.
Ele foi vaqueiro, plantou roças e tocou boiada.
Ele foi carreiro amansando muitos bois bravos.
E, como peão, acordava o mundo de madrugada.

É o Seu João um homem com missão cumprida,
Pois hoje a sua grande família está toda aí criada.
Ele é um grande pai e não deve reclamar da vida
Porque fez o possível pra ver a família realizada.

Assim termino pedindo Deus proteção divina
Para que essa família siga sempre harmoniosa,
Pois Dona Esteva com Seu João é quem ensina:
Família boa vive unida, é honrada e maravilhosa!


MENDES, Xiko. Sonhos, Silêncio e Saudade em minha viagem ao fundo do Lago Formoso. Bsb: Unifam, 2012.

ESTEVA RODRIGUES DE SOUZA (1929-2010): 6 ANOS DE SAUDADE.

Despedida Triunfal a uma Mãe Heroína!

(Homenagem à D. ESTEVA Rodrigues de Souza, 5/9/1929 –  3ª feira, 6/7/2010, 3:30).


Xiko Mendes (Penúltimo Filho de Dona Esteva).

Quando ela nasceu,
O céu estava claro
E as estrelas brilhavam.
Não se sabe a que horas,
Mas os anjos se reuniram
E disseram: nasceu uma GUERREIRA!
Ela não terá pai para criá-la, pois
Ele morrerá antes dos quatro anos dela.
Não terás mãe por muito tempo, pois
Morrerá antes de ela completar 20 anos.
Mas não será uma pessoa solitária,
Ou covarde diante da vida.

Ela será ousada, sonhadora, convicta

Daquilo em que vir a acreditar.
Será uma MULHER DE FÉ,
Profundamente religiosa,
Crítica, independente, polêmica...
Pois tudo que vir a pensar será dito
Ainda que isso doa na alma das pessoas.
Dar opinião e não ter medo de externá-las
Em qualquer lugar e para quem quer que seja
Será a marca maior de sua personalidade.
Será uma mulher firme sempre, mas
Muito meiga, sentimental, amorosa com todos;
Saberá sempre perdoar as pessoas
Logo depois de um conflito de opinião.
Assim sendo, ela cresceu, casou-se,
E viveu com o único homem de sua vida
Por quase sessenta anos.
Teve dez filhos, um punhado de netos,
Mais alguns bisnetos.
Ao longo da vida nunca se conformou
Em ser analfabeta.
Estudou, com apoio marital, todos os filhos.
Uns se formaram, outros aprenderam
O mínimo necessário para viver.
Ela era e será sempre nossa heroína.
E ela se orgulhava disso: de ter
Criado a filharada sozinha e na roça,
Sendo esposa de vaqueiro tão forte e
Herói anônimo e honesto do jeito dela.
Para nós, ela nunca fora analfabeta!
Ela não dominava a escrita, é verdade,
Mas escrevia sonhos em céus estrelados;
Não verbalizava a leitura, é verdade,
Mas lia com perspicácia e sensibilidade,
Interpretando no rosto de cada ser humano
O Grande Livro da Vida:
Esse livro que não é feito de papel,
Mas de experiências acumuladas,
De vivências compartilhadas e
Ideais diariamente perseguidos
Para ela e para o bem de todos ao seu redor.
Esse livro sem palavras
Tem como símbolo a vida em meio aos
Conflitos da Existência.
Ela era uma “leitora” atenta do Livro da Vida:
Sabia aconselhar;
Sabia ser prudente;
Sabia amar com o mais nobre e puro dos sentimentos
Humanos: o de ser mãe 24 horas! Sempre!!!
Morreu com quase 81 anos.
Mas nunca deixou de sonhar.
Nunca deixou de acreditar que viveria
O tempo suficiente para cumprir sua
Missão como mulher, como esposa,
Como mãe, como avó e como amiga
Fiel, sincera, verdadeira!
E todas as suas missões foram cumpridas!
Essa mulher, que tornou-se adulta sem pai e sem mãe,
Foi, para nós, a mais importante de todas as mulheres.
De tudo o que ela representa para nós,
Restaram cinco coisas como lições eternas de vida.

São frases das quais nunca esqueceremos:
1ª – Sonhem meus filhos, sonhem!
2ª – Deus não desampara ninguém! Acreditem em vocês!!
3ª – Não pague o Mal com o Mal porque Deus sabe a hora de dar respostas.
4ª – Nunca carregue mágoas; perdoe as pessoas sempre.
5ª – Não chorem no meu enterro, não chorem, pois DEUS sabe a hora de me levar.

DESCANSE EM PAZ, MAMÃE!!! Descanse!!
Que Deus e aqueles anjos – que anunciaram seu nascimento –
Se juntem como Mensageiros da Harmonia e do conforto espiritual
No Céu e na Terra,
“Na Alegria e na Tristeza;
Na Saúde e na Doença...”.
DESCANSE, MAMÃE!!! Descanse!!

– “Deus não desampara ninguém”: a Senhora sempre dizia isso.

E Ele, Deus, está conosco e sempre estará com você, mamãe!
Tchau, MAMÃE!!!
Um dia nos reencontraremos
Para lermos juntos o GRANDE LIVRO DA VIDA
Do qual você, mamãe, inscreveu-se como
Uma das AUTORAS, sempre escrevendo com a pena da
Esperança e do Amor sem pedir nada em troca.
TCHAU, MAMÃE!!! Não diremos ADEUS!!!
NÃO!!! NÃO DIREMOS!!!!

P.S.: Este poema foi escrito e concluído na terça-feira, Seis de julho de 2010, às 7:38:20, quatro horas depois da notícia de falecimento de minha mãe. Esse texto foi lido durante as Honras Fúnebres oferecidas à DONA ESTEVA RODRIGUES DE SOUZA, pouco antes do sepultamento, e foram feitas na manhã de quarta-feira, 7/7/10 na residência de Oládio, um dos meus irmãos. No cemitério, as homenagens foram feitas por um amigo da família, Sílvio Roberto Batista de Almeida, a quem agradecemos pela solidariedade. Obrigado!


 OBS.: Este poema foi publicado no livro SONHOS, SILÊNCIO E SAUDADE EM MINHA VIAGEM AO FUNDO DO LAGO FORMOSO, Unifam, 2012.